Câncer de Colo Uterino

 

 

 

Caroline Teles FIGUEIREDO

Eglídia Carla Figueiredo VIDAL

Albério Ambrósio CAVALCANTE

Anthunes Ambrósio CAVALCANTE

Câncer de Colo Uterino: Percepção de Mulheres Portadoras de HPV

 

 

 

 

 

Resumo

 

 

O papilomavírus humano (HPV) tem relação comprovada com casos de câncer de colo uterino, sendo os tipos 16 e 18 de alto risco oncogênico, considerando-o assim um fator de risco predominante. Este estudo tem como objetivo, conhecer a percepção de mulheres portadoras do HPV acerca de sua relação com o câncer cervical. Realizou-se um estudo exploratório descritivo de natureza qualitativa em unidades de saúde da família localizadas na cidade de Brejo Santo. A amostra foi constituída de 10 mulheres portadoras do HPV diagnosticadas através de exame papanicolaou, realizados em unidades de saúde da família. Para a análise dos dados foram elaborados quadros e temáticas seguidas de categorias de acordo com as falas das mulheres. Os dados revelaram que o fator de risco de maior relevância foi a precocidade da atividade sexual. Como resposta às atividades de educação e saúde, constatamos que todas foram conscientizadas da importância do seguimento semestral para controle da patologia. Em sua maioria, foi revelada a associação de sua contaminação ao parceiro.  Baseados não somente nesse estudo, percebemos o quanto é essencial a realização de atividades de educação em saúde sexual, visando à prevenção de infecções, ou quando não evitadas, o tratamento adequado e controle de complicações.

 

Palavras-chave: câncer de colo uterino, HPV, inter-relação, aspectos preventivos.

 

 

 

Introdução

 

Ao longo de sua trajetória, a humanidade sempre conviveu com o flagelo das doenças venéreas, aquelas que são transmitidas nas relações sexuais. Por essa razão, tais doenças sedimentaram representações negativas fortalecendo estigmas, preconceitos e sofrimentos, causando muitas mortes e seqüelas, principalmente, quando não havia ainda antibióticos.

O principal agente apontado como causador do câncer cérvico-uterino é o Vírus do Papiloma Humano (HPV). O exame citopatológico (Papanicolaou) permite que seja efetuada a detecção precoce em mulheres assintomáticas, contribuindo para a detecção de lesões precursoras e da doença em estágios iniciais. O exame preventivo também se caracteriza por ser um método de rastreamento seguro, sensível e de baixo custo. Apesar de esse método de rastreamento ter sido introduzido no Brasil desde a década de 1950, estima-se que cerca de 40% das mulheres brasileiras nunca tenham sido submetidas ao exame (CRUZ, 2008).

Os últimos dados publicados do Instituto Nacional do Câncer (INCA, 2007), referentes às estimativas de casos novos de câncer do colo do útero esperados para o Brasil no ano de 2008 é de 18.680, com um risco estimado de 19 casos a cada 100 mil mulheres. No Nordeste (18/100.000), esse tipo de câncer ocupa a segunda posição mais freqüente. No Ceará, a incidência é de 17,8/ 100.000 e em Fortaleza (18,49/100.000).

O câncer cervical é hoje, no Brasil, um sério problema de saúde pública, sendo a redução de seu impacto possível através de programas integrados de controle, desde que incorporados aos demais níveis do sistema de atenção à saúde. Desde 1984, através do Programa de Assistência Integral à Saúde da Mulher (PAISM), o Ministério da Saúde preconiza a prevenção do câncer ginecológico como uma das ações básicas na assistência prestada à mulher, e vem propondo estender a cobertura de atendimento ginecológico a todas as mulheres que se encontram na faixa etária reprodutiva através dos centros de saúde de atenção primária (BRASIL, 1994 apud PAULA et al, 2002).

Nos últimos anos tem-se constatado uma impressionante evolução quanto à relação entre câncer de colo uterino e HPV; assim, entre os anos 70 e 80 surgiram as primeiras evidências da provável associação e, no final dos anos 90, descrevia-se a presença viral em aproximadamente 100% dos casos de câncer cervical; por isso, passou-se a afirmar que não existe câncer do colo sem HPV (NICOLAU, 2003)

Deve-se ter em mente que este tipo de câncer ou lesões que o antecedem (pré-câncer) pode ser detectado em praticamente 100% dos casos, através de exames preventivos muito simples e aos quais todas as mulheres podem ter acesso: o Papanicolaou e a Colposcopia (PARELLADA, 2005).

A partir da observação dessa problemática é que surgiu o interesse por desenvolver um estudo relativo à percepção de mulheres portadoras do HPV, atendidas em Unidades do Programa Saúde da Família do município de Brejo Santo - CE, acerca do seu conhecimento sobre o câncer de colo uterino e sua associação com o HPV.

Essa pesquisa tem a finalidade de sensibilizar os profissionais de saúde, em especial o enfermeiro a rever o seu trabalho educacional em saúde sexual e reprodutiva visando à prevenção e possíveis complicações de DST, assim como para subsidiar o conhecimento e desenvolvimento científico de profissionais afins.

Considerando os determinantes sócio-culturais das clientes percebemos empiricamente, através da prática clínica, que há necessidade de informações que forneçam a mulher o empoderamento necessário para o enfrentamento da doença.

Diante deste panorama traçamos para este estudo o objetivo de conhecer a percepção sobre o HPV, a infecção e sua associação ao câncer de colo uterino de mulheres portadoras do vírus atendidas em Unidades de Saúde da Família no município de Brejo Santo – CE, caracterizando os sujeitos quanto aos dados sócio-econômico e histórico ginecológico.

 

Revisão de literatura

 

Câncer de colo uterino

De acordo com Weinberg (1997) apud AYOUB et al (2000), o câncer é um distúrbio genético no qual se perde o controle normal do crescimento celular. A célula tumoral difere da célula normal por não mais responder aos mecanismos normais de controle de crescimento. O mecanismo de desenvolvimento de todos os cânceres é a mutação, mudança do genótipo da célula, seja na linhagem germinativa ou, com freqüência maior, nas células da linhagem somática.

O sistema TNM envolve a avaliação de três componentes básicos: extensão do tumor primário (T); ausência ou presença de gânglios ou nódulos linfáticos regionais (N); e ausência ou presença de doença metastática à distância (M). Antes de 1992, os cânceres ginecológicos eram comumente classificados segundo um sistema distinto, desenvolvido pela International Federation of Ginecology and Obstetrics (FIGO). Atualmente este sistema foi incorporado ao sistema TNM (OTTO, 2002).

 

Quadro 1 – Definições gerais do sistema TNM

T

Tumor primário

Tamanho, extensão, profundidade do tumor 1º

TX

Tumor primário não é passível de avaliação

T0

Ausência de evidência de tumor primário

Tis

In situ

T1 a T4

Tamanho crescente e/ou extensão local do tumor 1º

N

Linfonados regionais

Extensão e localização dos linfonados desenvolvidos

NX

Não é possível avaliar linfonados regionais

N0

Ausência de metástase em linfonado regional

N1 a N3

Comprometimento crescente dos linfonados regionais

M

Metástase à distância

Ausência ou presença de disseminação à distância da doença

MX

Não é possível avaliar doença à distância

M0

Ausência de disseminação da doença à distância

M1

Disseminação da doença à distância

Fonte: Otto (2002, p. 56)

 

 

Quadro 2 – Diretrizes selecionadas para o estadiamento TNM

Estágio

TNM

FIGO

Câncer de colo de útero

0

T0

 

Ausência de evidência de tumor primário

 

Tis

0

Carcinoma in situ (pré-invasivo)

I

T1

I

Carcinoma cervical limitado ao útero (extensão para o corpo deve ser desconsiderada)

IA

T1a

IA

Carcinoma invasivo pré-clínico, diagnosticado apenas por microscopia

 

T1a1

IA1

Invasão estromal ≤ 3 mm em profundidade e ≤ 7 mm em extensão horizontal

 

T1a2

IA2

Invasão estromal > 3 até 5 mm, extensão horizontal de ≤ 7 mm

IB

T1b

IB

Tumor limitado ao colo maior do que T1a2/IA2

 

T2

II

Carcinoma cervical invade além do útero, porém não atinge a parede pélvica ou o terço inferior da vagina

IIA

T2a

IIA

Sem invasão do paramétrio

IIB

T2b

IIB

Com invasão do paramétrio

 

T3

III

Carcinoma cervical com extensão para parede pélvica e/ou comprometendo o terço inferior da vagina e/ou causando hidronefrose ou ausência de funcionamento do rim

IIIA

T3a

IIIA

Tumor invade o terço inferior da vagina, sem extensão para a parede pélvica

IIIB

T3b

IIIB

Tumor com extensão para a parede pélvica e/ou que causa hidronefrose ou ausência de funcionamento do rim

IVA

T4

IVA

Tumor invade a mucosa da bexiga ou reto e/ou extensão além da pelve verdadeira

IVB

M1

IVB

Metástase a distância

Fonte: Otto (2002, p. 72)

 

 

 

Etiopatogenia

 

Quanto aos fatores de risco relacionados à infecção por HPV, o número de parceiros sexuais durante a vida figura entre os mais importantes, além de: hábitos dos parceiros e a idade do parceiro masculino em relação à da mulher, com elevação do risco quanto maior a idade do parceiro (BASEMAN, 2005 apud RAMA, 2008).

Segundo Fiorezi et al (2004), constatou-se que embora seja expressiva a exposição por via sexual, às infecções também podem ser adquiridas por auto-inoculação de verrugas comuns da pele, durante o parto (no contato do recém nascido com trato genital da mãe infectada) por toque em áreas não sexuais, através de luvas cirúrgicas, pontas de cautério, roupas íntimas ou sabonetes contendo DNA/HPV. Menilk (1962 apud HALBE, 1993), estudando essas partículas virais, agrupou-as na família Papovaviridae, reunindo os papilomavírus e os poliomavírus, ambos DNA vírus, com capacidade de provocar crescimento tumoral e características ultra-estruturais similares.

 

 

Epidemiologia

A infecção genital causada pelo HPV é a doença sexualmente transmissível viral mais freqüente na população de vida sexual ativa, de acordo com a Secretaria de Saúde do Ceará (CEARÁ, 2002). Esses dados são confirmados por Kiviat apud Freitas (2002), para quem a infecção pelo HPV é a DST viral mais freqüente nos EUA.

Estima-se que as taxas de incidência de infecções causadas pelo HPV, possam alcançar cerca de 30-40% em pacientes abaixo dos vinte anos. Depois dos trinta e cinco anos a prevalência diminui para cerca de 10%, e a de infecções por HPV de alto risco (oncogênicas) cai para cerca de 5% (SCHIFFMAN, 1993 apud FREITAS, 2002). Enquanto a infecção pelo HPV diminui com a idade, a incidência do câncer cervical aumenta, sugerindo que a persistência da infecção pelo HPV é necessária para produzir lesões de alto grau. O pico de incidência do câncer de colo uterino ocorre 5 a 10 anos após a infecção pelo HPV. Contudo, a gestação aumenta o índice de infecção para 30% (FREITAS, 2002).

 

 

Diagnósticos do HPV

O diagnóstico das lesões provocadas pelo HPV não é realizado atualmente apenas pelo aspecto clínico. Isso pode induzir a erros e conseqüentemente, favorecer a evolução de neoplasias intra-epiteliais. Um diagnóstico mais preciso requer a realização de exames citológicos e colposcópicos de toda a área genital, de exame histológico e da identificação do grupo viral, pela captura híbrida e pela reação em cadeia de polimerase (PCR), identificando o status oncogênico do HPV. A peniscopia é indispensável, pois, devido às lesões serem assintomáticas em ambos os sexos, o homem pode representar uma fonte de reinfecção quando a doença não for convenientemente diagnosticada e tratada (FREITAS, 2001).

Bastos (1998), apresenta a importância da realização de outros exames, que apesar de não identificarem os tipos virais, diagnosticam as lesões provocadas pelo HPV:

·       Citologia cérvico-vaginal – os esfregaços obtidos da cérvice e do fórnice posterior da vagina podem fornecer o diagnóstico preventivo das diversas formas de NIC.

·       Colposcopia – é recurso de grande valor, não somente para o exame da ectocérvice, mas também, da endocérvice. Associada a citologia cérvico-vaginal, reduz, consideravelmente, o número ou falsa negatividade. A colposcopia serve para orientar a biópsia cervical, utilizando-se nesse particular o teste de Schiller.

·       Teste do ácido acético – é de grande valor no exame do colo uterino, porque as zonas aceto-brancas evidenciam infecção pelo HPV.

·       Biópsia – orientada pela colposcopia e pelo teste de Schiller, permite obtenção de fragmento para o exame histopatológico, base fundamental do diagnóstico.

·       Conização ou amputação cervical – este recurso se constitui em método propedêutico e, também, terapêutico. Deve ser praticada toda vez que a biópsia revelar NIC III.

 

 

 

Transmissão

As vias de transmissão do HPV são através do contato sexual com pessoas infectadas, o que ocorre na grande maioria dos casos; na relação materno-fetal durante a gestação, trans e pós-parto imediato; e fora do contato sexual, através de fômites: toalhas, roupas íntimas, vasos sanitários, banheiras, instrumentais ginecológicos sem garantia de qualidade no processo de esterilização. Entretanto, não se sabe por quanto tempo o vírus resista fora do organismo, porém, considera-se que a transmissão através de objetos contaminados não pode ser descartada (PARELLADA, 2005).

Em relação à transmissão perinatal foi detectada a presença de HPV 6, 11, 16 e 18 na orofaringe, conjuntiva e genitália de recém- nascidos. No entanto, observou-se durante o período neonatal um decréscimo de positividade do DNA-HPV, sugerindo mais uma contaminação inicial do que uma infecção propriamente dita (CEARÁ, 2002)

Segundo Halbe (1993), a prática comum de sexo orogenital pode ser o principal modo de transmissão em indivíduos sexualmente ativos. A presença de verrugas anogenitais em crianças sempre deve levantar a questão de um possível abuso sexual. Recentes evidências, descrevendo a tipagem do HPV, podem ajudar a definir, nesse caso, quem é o provável autor. Também deve ser realizado exame oral.

Os mesmos autores revelam que evidências laboratoriais sugerem que a transmissão do HPV por via não-sexual também pode ocorrer. Instrumentos contaminados podem infectar pacientes podendo ser a origem da propagação do HPV. Existe a possibilidade de que o vírus seja destruído quando exposto ao ar por longo período. Pesquisa de hibridrização realizada em luvas cirúrgicas detectou em 50% delas a presença do DNA-HPV.

 

 

Ações de enfermagem com a cliente portadora de HPV

De acordo com Diógenes, Rezende e Passos (2001), as ações de enfermagem implementadas com a cliente portadora de HPV são de fundamental importância para o controle da doença. Dentre essas ações, destacam-se:

·       Avaliar a ansiedade da cliente, orientando-a acerca da doença;

·       Explicar a importância de tratar o parceiro;

·       Explicar o procedimento do tratamento e as complicações que poderão surgir;

·       Evitar intercurso sexual durante o tratamento;

·       Orientar práticas de saúde, nutrição apropriada, exercícios, controle de peso e práticas sexuais seguras (uso de condons, evitar múltiplos parceiros sexuais);

·       Mostrar a importância do exame ginecológico periódico;

·       Orientar higiene perineal.

Tais medidas são acrescidas por Paradiso (1998) de:

·       Informar a cliente sobre a possibilidade de recidiva, pois as terapias atuais não eliminam o HPV.

·       Salientar quanto à importância do uso de preservativos para proteger-se contra o HPV.

·       Aconselhar as mulheres sobre a necessidade de triagem do câncer cervical durante toda a trajetória vital.

 

Tratamento

O objetivo do tratamento deve ser a remoção das verrugas visíveis e eliminação dos sintomas indesejáveis. As recidivas são relativamente freqüentes, pois mesmo destruindo a verruga não se consegue eliminar totalmente os vírus existentes na área genital. Como em qualquer doença viral, o sucesso do tratamento depende, em grande parte, da resistência específica de cada indivíduo. Assim, medidas gerais são também importantes para ajudar a melhorar os mecanismos de defesa como: diminuir o estresse, parar de fumar, alimentação equilibrada e horas de sono adequadas (PARELLADA, 2005).

Para Freitas (2001) deve-se focalizar a real necessidade do tratamento, uma vez que não há conhecimento suficiente para determinação de casos que regredirão espontaneamente, persistirão ou evoluirão para uma lesão intra-epitelial. Assim sendo, múltiplos fatores devem ser avaliados para a instituição do tratamento adequado, tais como: quadro clínico, associação com lesão intra-epitelial, idade do paciente, risco de transmissão, imunodeficiência associada, ansiedade da paciente e aspectos legais. Como contribuição à solução deste problema, a Secretaria de Saúde do Estado do Ceará afirma que todos os tratamentos estão direcionados apenas para a erradicação das lesões visíveis, o que não significa uma prova de cura, já que persistem as lesões subclínicas e/ou latentes (CEARÁ, 2002).

Na realidade não se trata o HPV, destrói-se a lesão causada por ele. Antes do tratamento destrutivo dessas lesões é importante o controle das infecções associadas. Esta destruição pode ser efetivada por métodos físicos: laser, eletrocauterização, criocauterização ou exérese cirúrgica; por métodos químicos: ácido tricloroacético a 80%, 5-fluoruracil, bleomicina, podofilina e podofilotoxina; e métodos imunoterápicos: imiquimod e interferon. O tratamento químico e imunoterápico são reservados para pacientes fora de período gestacional (FEBRASGO, 2004).

 

 

 

 

Metodolo

 

Tipo de estudo

Esse estudo se constitui de uma pesquisa exploratória descritiva e, de acordo com a abordagem do seu problema, é de natureza qualitativa. Leopardi (1999), afirma que este tipo de pesquisa é utilizado quando não se podem usar instrumentos de medida precisos, por fazer uso de dados subjetivos, através de estudos, sejam de um caso particular, de avaliação de programas ou propostas de programas. 

 

 

Contexto do campo de estudo

Este estudo foi realizado em Unidades de Saúde da Família, localizados na cidade de Brejo Santo - CE, que dista da capital Fortaleza 508 km. O referido município conta com 13 unidades de Saúde da Família (USF), sendo oito na zona urbana e cinco na zona rural. Segundo dados do IBGE (2007), a população aproxima-se de 44000, correspondendo a uma cobertura de 93% da população assistida.

 

 

Sujeitos do estudo

Fizeram parte do estudo dez (10) mulheres, selecionadas mediante indicação da enfermeira assistencial, para facilitação do acesso da pesquisadora aos sujeitos do estudo, uma vez que esta investigação trata-se de pesquisa qualitativa cujo escopo busca a compreensão sobre o conhecimento da infecção e sua associação com o câncer de colo uterino. Estas mulheres realizaram o exame de Papanicolaou previamente, em cujo resultado foi detectado o Papilomavírus Humano (HPV).

 

 

Processo de coleta de dados

A coleta de dados do estudo foi realizada no período de março a junho de 2008, utilizando-se a técnica de entrevista.

O instrumento dividia-se em duas partes: a primeira, voltada para a obtenção de dados sócio-econômicos das mulheres e a segunda, referente aos dados gineco-obstétricos, incluindo questões destinadas a investigação sobre o seu conhecimento acerca do HPV e sua relação com o câncer cérvico uterino.

 

 

Análise dos dados

Os dados deste estudo foram analisados a partir de sucessivas leituras para compreensão e apreensão de idéias e informações citadas pelos sujeitos da pesquisa. Assim como foi realizada uma categorização dos depoimentos.

 

 

Considerações éticas

Nesta pesquisa foram levados em consideração os aspectos éticos contidos na resolução 196/96 que regulamenta a pesquisa envolvendo seres humanos, particularmente, em relação a dados relativos a pessoas atendidas ou participantes do referido estudo.

No entanto, para a realização das entrevistas, foi utilizado um termo de consentimento, onde foi lido e assinado pelas mulheres que aceitaram a participar do estudo, sendo-lhes assegurado o seu anonimato.

É importante destacar que essas mulheres foram identificadas com os seguintes nomes de flores: HORTÊNCIA, ROSA, CRAVO, LÍRIO, GIRASSOL, VIOLETA, MARGARIDA, ANGÉLICA, FLOR DE LIS e TULIPA, garantindo assim o anonimato e, como forma de agradecimento pela serenidade com que nos forneceram os relatos vividos diante do diagnóstico da patologia em estudo pela sua associação com o câncer cervical uterino.

 

 

 

Apresentação e análise dos dados

 

Caracterizando os Sujeitos da Pesquisa

A faixa etária predominante das mulheres portadoras de HPV entrevistadas encontra-se entre 19 e 25 anos (6), ou seja, iniciando na faixa etária da adolescência tardia, para a idade adulta jovem. Por conseguinte, três (3) delas encontram-se na faixa de 35 a 40 anos, e apenas uma (1) na pós-menopausa, aos 59 anos.

Com relação à procedência das mulheres pesquisadas, três (3) delas são procedentes da zona rural, acompanhadas em duas unidades de saúde da família (USF) rurais e sete (7) delas procedem da zona urbana, atendidas nas cinco USF sorteadas na sede.

            No que se refere às características ginecológicas, destacamos inicialmente a menarca, que entre as entrevistadas, ocorreu, predominantemente, entre 11 e 12 anos seis (6), seguidas de quatro (4) entre 13 e 15 anos. Duncan (2004) cita que no Brasil, a menarca situa-se entre os 11,8 anos e 12,2 anos.

Com relação à idade da primeira relação sexual, observamos que a sua maioria, seis (6) iniciou a vida sexual antes dos 20 anos, e apenas quatro (4) revelaram que esta ocorreu entre 20 e 24 anos.

Quando indagadas quanto ao uso do preservativo na primeira relação sexual, observamos que a grande maioria sete (7) afirmou não ter usado. Interessante salientar algumas de suas justificativas como a participante Rosa, que afirmou que nem existia quando a mesma iniciou sua vida sexual, e Margarida relatou que não tinha consciência da sua importância para a prevenção de DST.

Quanto ao uso de outro tipo de contraceptivo, identificamos que duas (2) encontram-se grávidas, uma (1) faz uso de anticoncepcional injetável, três (3) usam anticoncepcional oral e (1) uma usa a técnica da tabelinha.

Quanto ao número de parceiros, é interessante ressaltar que em sua maioria sete (7) se relacionaram com apenas um parceiro, duas (2) delas relataram ter tido dois, e uma (1) afirmou relacionamentos “fixos” anteriores com três parceiros.

Com relação ao diagnóstico de outra DST, a metade da amostra (5) citou a ocorrência de outra DST, dentre as quais a presença de herpes (1), candidíase (2) e vaginose bacteriana (gardenerela) (2). Vale ressaltar que as mesmas não são consideradas exclusivamente sexuais, considerando-se a ocorrência de fômites, assim como alteração imune.

 

 

Dados quanto à realização do exame cérvico-uterino

Quanto à realização do primeiro exame preventivo na vida das mulheres deste estudo, essa ocorrência variou de dois anos a treze anos anteriores à data da entrevista.  Contudo, evidenciamos que em quatro (4) delas o primeiro exame também representou o momento da descoberta do HPV, e em associação a idade dessas mulheres, apresentavam faixa etária variando de 19 a 25 anos no momento da descoberta.

 

“Tá com uns dois anos atrás, que eu fiz a primeira prevenção, aí conforme eu fiz essa prevenção, eu detectei o HPV, aí a enfermeira me encaminhou pra mim  fazer o tratamento, aí concluí o tratamento todo certinho, aí por isso mesmo quando eu fui fazer a próxima prevenção, já não detectou mais nada”. (lírio)

 

 

Temáticas e Categorias

 

Diante dos discursos dos sujeitos do estudo, foram analisadas as falas e expressões sendo encontradas as seguintes temáticas e categorias de análise, quais sejam:

 

 

TEMÁTICA - Sentimentos Vivenciados Frente ao Diagnóstico

 

Categoria – Medo diante da patologia

 

“Medo (respira ofegante), medo de tudo, num tem nem explicação pra medo” (hortência)

 

De forma significativa o medo diante do diagnóstico de HPV representa o medo de câncer, e aos seus aspectos próprios, culturalmente absorvidos pela população e associado à idéia de dor e morte, como destacados nos recortes a seguir:

 

“É, é o medo de ter câncer, né?” (rosa)

“Fiquei com medo de ser uma doença que não tivesse cura” (tulipa)

 

O medo é o sentimento dominante diante da informação de que alguns tipos de HPV influenciam na gênese do câncer de colo uterino, revelando assim o interesse em conhecer os seus verdadeiros riscos.

 

“A princípio eu fiquei muito assustada, porque eu já achava que tava com câncer do colo, mas depois fui buscar informações em livros, internet, e vi que o vírus se você tratar, ele não causa nenhum câncer [...]. Na hora foi um susto, porque o nome já assusta, um papilomavírus humano, eu achava que eu já tinha menos de um ano de vida...” (margarida)

 

As mulheres investigadas expressaram também aspectos que envolvem a conjugalidade, com sentimentos presentes diante da infecção pelo HPV, aonde a “confiança” no parceiro foi “quebrada” e revelada pela infecção.

 

“Eu fiquei muito assustada e com raiva do meu noivo” (violeta)

“Mulher, só pode ter sido do infeliz do meu marido” (tulipa)

 

 

TEMÁTICA - O CONHECIMENTO SOBRE O HPV

 

Categoria - Noções Básicas sobre o HPV

 

A exploração das falas das mulheres referentes ao nível de conhecimento acerca da doença nos revelou que todas tinham consciência do seu problema de saúde. Representando assim o resultado do trabalho de educação em Saúde realizado através da divulgação das DST em geral, focalizando o HPV e demais fatores de risco associados no desenvolvimento do câncer cérvico uterino.

 

 “É um vírus (pausa), vírus, vírus, é o vírus HPV, né?”(hortência)

“Eu acredito que seje essas doença adquirida sexualmente, e que tem umas que precisa ser com um contato bem direto” (cravo)

 

            Notamos que a informação mais relevante foi a da associação do HPV como sendo um vírus transmitido através da relação sexual. É interessante observar que em sua maioria, as entrevistadas classificam o vírus como sendo transmitido exclusivamente por via sexual, contudo a participante violeta enfatiza que dentre das formas de contaminação, a mais comum é a sexual.

Categoria - Ênfase no tratamento

           

Notamos que das informações repassadas as pacientes, as mais relevantes são relacionadas à importância do tratamento, como forma de prevenção de complicações, a citar principalmente o câncer cervical.

 

“Me falaram que se não tratar direitinho, pode virar um câncer” (violeta)

“É que ele dá o câncer, né? Do colo do útero, se não se tratar, se não fizer o tratamento certinho, né?” (rosa)

 

 

Categoria - Relação do HPV com o câncer de colo uterino

 

Quando indagadas sobre a relação do HPV com câncer de colo uterino, percebemos que foi unânime a opinião que estão intimamente ligados. Apesar de muitas informações fornecidas durante as palestras educativas, realizadas frequentemente por ocasião da consulta de enfermagem antes da realização do exame de prevenção de câncer ginecológico, ainda há desconhecimento da doença por parte da nossa clientela, levando-nos a refletir sobre a metodologia mais adequada a ser empregada para a educação em saúde sexual.

 

“É que se não tratado, pode, é, pode com o tempo depois virar um câncer uterino” (lírio)

Oxente, tem tudo a ver, pois se não tratar o HPV, ele se transforma numa doença muito grave, que é o câncer do colo uterino” (girassol)

Tem porque é do colo do útero, tem tudo a ver, que com o tempo pode ter o câncer do colo do útero” (flor de lis)

 “Que é um vírus que se não tratando desde o início pode causar o câncer de colo uterino” (girassol)

 

De acordo com a Secretaria da Saúde do Ceará (2002), para o controle da transmissão do HPV e promoção do diagnóstico precoce deve ter como componente a constante informação à população em geral, como estratégia de prevenção.

           

Categoria - A contaminação atribuída ao companheiro

 

            No que concerne ao conhecimento sobre sua contaminação, percebe-se que a grande maioria, sete (7), atribui sua contaminação ao marido, seja através de julgamento de traição, assim como às relações anteriores do parceiro, é interessante comentar que uma delas atribui à contaminação ao início precoce da vida sexual.

 

“Eu não sei não, eu só acho que foi dele, porque ele passa de ano sem vim em casa, e homem não vive sem mulher, né?” (rosa)

Através das relações desprotegidas com o meu marido” (girassol)

 

 

TEMÁTICA - Alterações genitais no parceiro

 

Categoria – Não apresenta lesão ou alteração

 

Quando indagadas sobre a ocorrência de lesão genital no seu parceiro, a metade da amostra negou qualquer alteração.

 

“Não, não apresenta nada, nem um tipo de verruga, nem corrimento, nem nada, nada” (lírio)

“Não, eu olho, eu examino bastante para ver se tem ou não” (hortência)

 

Percebemos que as mulheres por apresentarem lesões clínicas do HPV acabam por adotar a postura de examinar os seus parceiros para confirmar se também apresentam essas lesões, contudo a não confirmação de lesões no companheiro parece produzir a incerteza de como realmente adquiriram a infecção.

 

 

Categoria - Sinais clínicos ou desconforto

 

Por conseguinte, das cinco (5) que revelaram alterações nos seus parceiros, três (3) referiram características de sinais clínicos de lesões causadas pelo HPV e duas (2) citaram apenas sintomas de desconforto (corrimento e prurido).

 

“Apresenta umas verruguinhas na cabeça do pênis” (girassol)

“Teve um sinalzinho no pênis” (tulipa)

 

Notamos que todas as mulheres procuram conferir em seus parceiros alterações relacionadas ao HPV, principalmente pelo fato de associar sua contaminação a eles.

 

“Quando a gente morava ainda juntos, eu via que ele tinha um corrimento na cueca” (rosa)

“Não, não sei, só vejo muito ele coçando “as partes dele”, (risadas)” (violeta)

 

De acordo com a Secretaria de Saúde do Ceará (CEARÁ, 2002), as verrugas genitais são mais freqüentes nas mulheres do que no homem, apresentando uma distribuição multicêntrica.

 

 

Categoria – Acompanhamento independente de alterações

 

Com relação ao acompanhamento médico, constatamos que praticamente, somente os que apresentaram lesões, procuraram acompanhamento, sendo que apenas dois dos que não referiram alteração foram acompanhados através da peniscopia e tratamento tópico respectivamente.

 

“Após o primeiro exame que foi feito e deu negativo e, até hoje não apareceu nenhuma alteração, aí não, não faz mais” (margarida)

 

 

 

 

Considerações finais

 

            A realização deste trabalho tornou-se uma experiência marcante em minha trajetória vital, por estar abordando temas que se encontram em constantes pesquisas e, através das mesmas, aumentou ainda mais o interesse por conhecer a problemática. Conhecer a relação predominante entre o papilomavírus humano (HPV) e o câncer de colo uterino que tanto amedronta a população de vida sexualmente ativa, assim como os profissionais de saúde, levando-os a refletir sobre a valorização das atividades de educação em saúde.  

            Baseados nessa problemática, decidimos conhecer a percepção de mulheres portadoras do HPV acerca da associação de sub-tipos desse vírus com o câncer de colo uterino, por ser fator predominante nesta ocorrência, contudo só quem o contraiu poderia descrever seus conhecimentos e sentimentos sobre essa problemática relação.

            Na pesquisa realizada, constatamos que os fatores de risco para os dois problemas são basicamente os mesmos, a citar o inicio precoce da atividade sexual, a multiplicidade de parceiros sexuais, como também o uso prolongado de anticoncepcional oral e a multiparidade. Vale ressaltar que o fator que predominou foi a precocidade sexual, relatada por mais da metade da amostra. Com relação à variável multiplicidade de parceiros, não teve influência considerável.        Quanto à realização do exame, constatamos que em quatro delas o diagnóstico do HPV já se revelou no primeiro resultado. Salientamos que todas as mulheres encontravam-se conscientizadas da importância do seguimento semestral da citologia para controle da patologia. 

            É essencial a prática das ações de Educação em Saúde sexual no cotidiano dos atendimentos voltados para a população feminina, focalizando os fatores de riscos para o desenvolvimento do câncer cérvico uterino, além da importância da realização periódica do exame preventivo, visando à detecção precoce de alterações pré-neoplásicas.

            Espera-se que o estudo tenha fornecido informações relevantes sobre o asunto e que possa subsidiar os profissionais de saúde, em especial o profissional enfermeiro na avaliação das ações atualmente desnvolvidas e na identificação da nessidade de planejamento e implementação de novas estratégias que objetivem a promoção e manutenção da saúde da mulher.

 

 

Referências

 

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Sobre os autores:


1. Caroline Teles Figueiredo é Enfermeira com Especialização em Saúde Pública pela

           Universidade Estadual do Ceará. E-mail: caroltales@yahoo.com.br.        

2. Eglídia Carla Figueiredo Vidal é Enfermeira e Mestre em Enfermagem pela

     Universidade Federal do Ceará;
3. Albério Ambrósio Cavalcante é Fisioterapeuta, especialista em saúde Pública pela

     Universidade estadual do Ceará – UECE.  E-mail:alberiobs@hotmail.com;

4. Anthunes Ambrósio Cavalcante é Enfermeiro e Pós-graduado em Saúde Pública;

           E-mail: enfermeirunes@hotmail.com;